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>> Colunistas > Lázaro Freire
Desrespeito das religiões aos suicidas Publicado em: 10 de novembro de 2009, 01:43:09 - Lido 4024 vez(es)
Pedro,
Sei do juízo severo que muitas religiões fazem dos suicidas. Com o louvável intento de coibir as pessoas de atentarem contra a própria vida (o que talvez justifique o uso das ameaças e terror); se esquecem da DEVASTAÇÃO PSÍQUICA que fazem nas famílias das vítimas: a religião dá alento a todos os mortos e seus familiares, mas, ah, suicidas não... Seus parentes devem saber que - dizem - ele inevitavelmente está sofrendo nos umbrais ou inferno. Podem no máximo rezar para que saia logo do seu "erro".
Esse discurso é bem intencionado, e é melhor talvez que seja assim do que termos mais jovens se suicidando. Se nós, pais sociais, falhamos antes ao não conseguimos lhe dar SENTIDO para encontrar em si a razão de sua existência; então que pelo menos lhe enfiemos religião e repressão, para que eles fiquem aqui. Assim não repousará sobre nós e nossa inércia a culpa conjunta por um modelo social onde pessoas tão cheias de vida e alegria como seu amigo Olavo podem optar por em não querer viver e compartilhar. Em outras palavas: É dificílimo para nós compreendermos nossa parcela de assassinato em cada suicídio. Não queremos pensar que são exatamente tantas repressões que nós todos fazemos (inclusive na religião) sobre os Olavos que alimentam o suicídio e falta de sentido que colaboram para o aumento de suicídios. E dói mais ainda em nós aprendermos a respeitar as decisões do Outro, mesmo (ou principalmente) as mais extremas ou que não fazem sentido aos olhos da nossa fé.
RESPEITO, em geral, é o que um suicida pedia. Acho injusto, já que negamos isso a ele na vida do qual ele desistiu, que mesmo depois de morto continuemos desrespeitando suas decisões - ainda que uma ultima, extrema e grave decisão. É roubar de sua memória a dignidade ultima. Julgamentos moralistas de um suicida, especialmente para a família, são o mesmo que fazê-lo ter morrido em vão.
Não estou dizendo com isso que suicídio seja bom ou justificável. Só penso que quando nossas convicções religiosas recriminam - com razão - o suicídio, não estão fazedo isso para que julguemos O OUTRO. Toda e qualquer religião só faz sentido na medida em que NOS religa à NOSSA essência. Todos os bons códigos éticos e morais da religião servem para que EU, que nela creio, norteie as MINHAS ações de cunho ético. O Olavo só pode responder a si próprio, de acordo com o seu próprio grau de conhecimento e consciência dessas questões.
Se é para acreditarmos em um Deus, só faz sentido se Ele for bem mais justo do que nós - e nossos limitados mitos e religiões. Portanto, se confia n'Ele, confia. Ele conhece o coração do Olavo, e fará justiça à sua índole, em Amor. E se não acredita n'Ele, não há com que se preocupar, tudo é nada, tudo é tudo, e então respeitemos o ato do Olavo, concordando ou não. Em ambos os casos, havendo ou não um Deus maior, não há NINGUEM julgando seu amigo, a não ser algum livro ou pastor.
Se é para falar de extremos, vale então uma ultima reflexão:
Quem é mais "suicida", quem nega mais a vida?
- Uma pessoa amiga, divertida, de boa índole, bons relacionamentos, que adquire uma doença depressiva (podia ser gastrite, dor de barriga, bicho do pé, pneumonia, aids, gripe, frieira - mas foi uma depressão fatal) e que por um ato isolado nesse estado depressivo pula de um prédio, sem total consciência das forcas INCONSCIENTES que atuavam nele? ou - Um religioso, espirita ou não, que mesmo tendo acesso a questões que remetem ao lado inconsciente da vida, e mesmo percebendo o milagre que é viver esse instante breve diante da eternidade; AINDA ASSIM PREFERE negar a existência material, e/ou se alijar do convívio social, profissional, amoroso, urbano, acadêmico, financeiro, existencial, etc; e passa a vida negando a vida com a desculpa de que cuida aqui, por antecipação, das coisas que todos teremos que enfrentar QUANDO do lado de lá?
Não confunda momento e expressão da morte com qualidade e experiência de vida. Qual dos dois acima de fato jogou fora a vida terrena que Deus lhe emprestou, ainda que morrendo como "santo"; e qual dos dois viveu bem a vida enquanto nela teve dignidade, ainda que infelizmente tendo sido vitimado por UM momento em que sua não-reflexão converteu-se em ato fatal?
Que atire a primeira pedra, evangelho segundo o espiritismo ou ticket de trem para o Vale Dos Suicidas aquele que NUNCA teve desespero, desesperança e atitudes impensadas, tão ou mais destrutivas que a do Olavo; com a diferença apenas que mataram outras coisas, mais simbólicas que a propria existência biológica.
Suicidas, aqui há muitos. Os mais covardes sobrevivem (o que é bom), para julgar o outro (o que é mal). Em momentos assim, precisamos de menos religião... e mais espiritualidade e compaixão.
Laz
--- Em voadores@yahoogrupos.com.br, "pedro_simao" <pedro_simao@...> escreveu > > Voadores, amigos, irmãos, > > Pouquíssimas vezes utilizei essa lista para enviar qualquer mensagem. Mas hoje a noite, sem conseguir dormir, e com uma comoção fortíssima em meu coração decidi escrever-lhes, e acho que é o momento certo. > > Me chamo Pedro Simão, tenho 25 anos, e nesta última sexta-feira a noite um amigo muito próximo se suícidou. Ele se jogou pela janela do escritótio onde trabalhava, a noite, do 17º andar... E ele planejou tudo, a tarde deixou registrado no cartório que gostaria de ser cremado quando morresse. No sabado a noite, quando eu soube da notícia, eu mal conseguia acreditar. Meu amigo, Olavo Rocha, de 24 anos era uma pessoa verdadeiramente brilhante, de tão brincalhão eu cheguei a pensar que tudo se tratasse de mais uma de suas brincadeiras quando recebi uma msg pela internet, de um amigo em comum. > > Olavo, meu amigo, era muito inteligente, tinha um QI acima da média e qualidades intelectuais que eu admirava... ele tinha amigos, se socializava muito bem. Sempre teve namoradas. Tinha uma família exemplar, uma mãe dedicada e coruja, um pai estudioso e bem-sucedido, um irmão mais novo pacífico e de-bem com a vida. Ele viveu na França por um ano e conheceu a Europa quase por inteiro, viajou muito. Ele não era viciado em drogas e não tinha histórico algum de depressão... Seu suicidio foi uma surpresa horrível para todos... ninguem poderia supor que isso podia acontecer. > > Umas semanas antes ele deu algum indício, pelo que conversei com a mãe dele, ele mostrou sinais de depressão, se isolou no quarto e ninguem conseguia se aproximar muito. Uma amiga (não-namorada), relatou que depois que transaram pela ultima vez ele deitou nos braços dela chorando e dizia que não tinha vontade de fazer mais nada, nem trabalhar, nem estudar, nem fazer os filmes dele, que era o que ele mais gostava. Os filmes do meu amigo Olavo eram sempre divertidos, sempre com piadas... todos eles ainda estão no Youtube em www.youtube.com/fonft > > Videos como esse: http://www.youtube.com/watch?v=uuhptZgymF8 fascinavam todos nós, amigos do Olavo... que desejavamos participar dos videos, e se divertir tb. Realmente esse era um hobbie muito incomum e interessante que ele tinha. Ele me fazia sentir-me criança denovo. Filmar com o Olavo, me lembrava dos tempos felizes da minha infância. > > Outra coisa de incomum no Olavo, é que ele era um pouco obscedado pelo tema do comunismo. Ele estudou economia na PUC e por conviver com muitos pensadores neoliberais gostava de conversar sobre o assunto e confrontar as ideologias comunistas e liberais... Ele se colocava contra nossos conhecidos porfessores de história, que geralmente adotam posturas comunistas... sempre falava como o comunismo assassinou mais pessoas do que o nazismo. Isso está expresso de maneira excentrica em muitos dos seus videos. Mas eu não acredito que seja esse o motivo. > > Sem dúvida um desgosto e sofrimento intenso tomaram conta dele tão rapidamente que ninguem pode suspeitar. Talvez uma doença quimica. Ele era uma pessoa muito especial, a falta que ele irá fazer a esse mundo será enorme, mas se ele infelizmente decidiu assim. Mesmo que ninguem possa aceitar essa decisão. > > Agora, eu aqui sozinho, tendo pensado sobre isso dezenas de vezes decidi compartilhar com vocês a minha dor de perder esse amigo tão próximo. Algumas pessoas com quem conversei, e minha própria mãe, me falam do destino terrível que os suícidas muitas vezes têm. Mas o que eu desejo para o Olavo é que ele consiga se libertar logo deste mundo e ir explorar tranquilamente o universo. Eu gostaria de garantir isso para ele. Se ele decidiu se afastar de nós, de nossas cidades gigantescas, nossos rios e ares poluídos, nossas guerras injustificáveis, que ele encontre a paz do outro lado e fique distante de tudo isso que nos faz sofrer tanto. > > A vocês, voadores, peço um auxílio especial. Eu adoraria ter certeza que o espírito do meu amigo está voando agora, rumo a planetas menos sombrios e paraísos para a alma. Talvez eu deseje até que ele voe na frente de todos nós que ficamos, para quando nossa hora chegar, ele possa nos guiar pelos caminhos lá de fora. Mas temo que agora ele precise de mais ajuda do que possa doar. > > Eu tenho um amor enorme no coração pelo Olavo, pela grande amizade que tivemos... Devo muito a ele... Se eu pudesse, apesar de ter um corpo, e estar bem vivo, eu gostaria de voar agora para ter certeza que ele está bem, onde estiver. Eu disse a mãe dele que eu procuraria meus guias espirituais para auxiliar nessa passagem, então gostaria de convidá-los a serem meus guias... considero a todos aqui como tais. Por terem a coragem de conversar sobre esses assuntos tão profundos, de maneira aberta e despretensiosa. Deixar nossos corpos astrais voarem, pode ser um grande remédio para nossas almas, principalmente nesses momentos extremos. > > Com toda minha sinceridade... >
-- Lázaro Freire lazarofreire@voadores.com.br
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